Objetivo


terça-feira, 7 de setembro de 2010

POLÍTICA - APARELHAMENTO DO ESTADO

OPINIÃO
Texto de Reynivaldo Brito

Estou preocupado com o cinismo estabelecido no Estado brasileiro , como se mentir fosse a maior qualidade do cidadão. O pior de tudo é que a grande maioria da população inebriada pelas esmolas diz amem, a exemplo dos novos cristãos que desconhecem membros de sua família ao serem "convertidos" numa nova seita.
Não temos muito a quem apelar, porque até o movimento estudantil, do qual participei lutando contra a Ditadura, hoje é uma perna manca desta situação. Dizem que o dinheiro é coisa de satanás, e vejam que muitos dos que estão aí se emporcalhando e jogando no lixo seu passado eram críticos ácidos dos governantes anteriores que cultuavam estas práticas. Agora, se comportam muito pior que eles.
O aparelhamento da Receita Federal, Banco do Brasil, Fundos de Pensão, Caixa Econômica Federal, Petrobrás, Itamaraty e até mesmo das agências regulatórias, todos os órgãos federais , muitos estaduais e municipais vão causar um mal tão grande a este país que, pelo menos, uma nova década vai se perder no futuro, para restabelecer o estado de direito.
A resposta dada pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, candidato a reeleição, a um repórter que lhe indagou se a sua proposta de criar uma hegemonia suprapartidária no Brasil não era perigosa, porque assim exterminaria com a oposição, foi a seguinte: "Ai é um problema da oposição, não nosso". Isto está publicado na Folha de São Paulo, do dia 6 de setembro de 2010.
O comissariado está realmente disposto a acabar com a oposição , amordaçar a imprensa, e os instrumentos de que o cidadão podia dispor para se defender, já estão cooptados ou contaminados, a exemplo da Câmara Federal, parte do Senado, Ministério Público, Justiça ( em todos os níveis) e por ai vai. Não vejo solução à vista .
O guru maior de plantão disse num comício em Guarulhos, recentemente, que esta denúncia de quebra de sigilo não existe. É invenção . Foi aplaudido efusivamente, inclusive por um deputado que mais parece um mordomo de filme de terror. Pergunta-se a quem interessa esta quebra de sigilo? Por que só filiados do PT quebraram o sigilo dessas pessoas? As respostas são óbvias.
Para eles o mensalão não existiu, os dossiês, que se multiplicam também não existem, a quebra de sigilo do caseiro Francelino é uma farsa , e assim continuam esculhambando com este país, nivelando tudo por baixo no maior cinismo e descompostura.
Lembro das trevas da ditadura. Estou agora visualizando novos tempos de trevas, com um viés pior ainda. Tomara que eu esteja completamente equivocado. Ficaria muito feliz. Mas, duvido.

CRÔNICA - MENINA DO CABELO ALISADO

CRÔNICA
Texto Reynivaldo Brito

Ele nunca soube se a menina também ficava indignada. Nem se acreditava em mandingas, feitiços, pragas e olho ruim .Tampouco se ela vestia vermelho nas quartas e branco nas sextas-feiras. Só a via subindo as ladeiras seculares da velha Bahia balançando as cadeiras distribuindo sua meiguice, como muitas outras que têm o cabelo duro. Elas travam uma batalha interminável. Amarram o coitado, estiram , espicham e até enrolam, tudo na santa inocência em busca da beleza. Não sei realmente o que buscam ,porque já nasceram belas. Essas meninas são ingênuas, maldosas e briguentas. Porém, têm uma sensualidade indescritível.
Antonio Paixão , vende pentes e cigarros na esquina da Rua Chile, conheceu uma delas, e foi paixão à primeira vista. Passava o tempo todo olhando as revistas numa banca de jornal localizada junto ao seu ponto .Ficava deslumbrado com aquelas páginas coloridas por onde desfilam meninas de todas as cores e gostos. Morenas e loiras com seus pertences expostos, como carne verde num açougue. Outras, mais compostas, desfilando em roupas extravagantes, as quais nenhum ser normal jamais vai vesti-las. Via as que aparecem nas revistas mostrando novas fórmulas mágicas de emagrecimento. Ainda, as das novelas e, as cantoras com textos acompanhando, informando de separações, reencontros e desencontros. Mas, nenhuma delas desperta a atenção de Antonio, o rapaz da banca de pentes e cigarros.
Está focado na menina de cabelo duro e enrolado que viu numa tarde de segunda-feira subindo em direção a Praça da Sé. Foi nela que ficou concentrado todo o seu tempo enquanto folheava dezenas de revistas novinhas repletas de garotas de todos os tipos e poses. A imagem que vislumbrava era da menina que vestia uma saia curta deixando à mostra pedaços de suas coxas torneadas e morenas. A blusa era uma gracinha de leveza e, assim caminhava balançando num ritmo doce.Quase levitando sobre o passeio.
Passados três dias, eis que a menina de cabelo duro e enrolado surge vindo da Misericórdia em direção a banca de Antonio. Ficou parado como que tivesse hipnotizado olhando e admirando a sua deusa, que mais uma vez, surgira do nada. A cada passo ia se aproximando e o seu coração palpitava com mais força à medida que a distância entre os dois diminuía. Ao chegar à sua frente a menina dirigiu-se a ele e indagou : O senhor sabe onde fica a loja Africana? Antonio logo se dispôs e informar que estava bem próxima da loja. Não se conteve e perguntou à menina de cabelo duro e enrolado: O que você quer na Loja Africana? Piscou o olho e respondeu, com um riso no canto da boca, estou procurando comprar uma chapinha para alisar o meu cabelo. Antonio reagiu dizendo em voz alta. Não faça isto! Você está tão linda com este cabelo duro e enrolado, que acho desnecessário gastar este dinheiro.
Mas, a mania de chapinha se espalhou pela cidade de tal forma que quase não mais vemos nas ruas e ladeiras de Salvador uma menina de cabelo duro e enrolado. Agora elas se transformaram em meninas de cabelos duros, lisos e brilhosos, perderam aquela graça da espontaneidade e da faceirice com um toque africano.
O dono da banca passou a observar outra coisa. Quase todas às vezes que avistava a menina do cabelo de chapinha notou que trajava a mesma surrada roupinha. Um vestidinho com uma blusa tomara-que-caia, rodado e da cor azul do mar. Este vestido ela vestia com uma simples calcinha por baixo deixando o dono da banca cada vez mais louco para ter um romance . Ela nem sonhava ou imaginava as elucubrações de Antonio e passava faceira esbanjando a sua simplicidade, um pouco temperada com certa meiguice e displicência.
O tempo foi passando e de quando em vez Antonio botava os olhos na menina misteriosa do cabelo alisado. Aí arquitetou perguntar o seu nome e telefone. Na próxima vez que passar por aqui vou puxar conversa. Se conseguir desengasgar na hora, vai ser o dia de maior felicidade para mim. Quase um mês depois, eis que surge em sua frente a menina. Ele nem sabia de onde viera, se da Misericórdia ou da Ladeira da Praça. A verdade é que estava diante dele com seus cabelos lisos e brilhosos e os olhos cintilantes. Ao vê-lo deu um riso de cumprimento. Antonio ficou emocionado e as perguntas que tanto arquitetou fazer não saíam. Vendo que ele estava um pouco aflito, perguntou. O senhor está sentindo alguma coisa? Não, não, respondeu Antonio. E deixou mais uma vez a menina escapar em direção a Ladeira da Praça, sumindo para sempre.

ARTES VISUAIS - LEONEL MATTOS E AS TRILHAS

ARTES VISUAIS
Texto de Reynivaldo Brito


Quando converso ou telefono para Leonel, para saber de suas realizações e indignações mais recentes, sinto que fica agitado e começa a falar sem parar, enfocando uma série de assuntos e ligando um a outro . É uma explosão de vida. Sua energia me deixa curioso em saber onde ele consegue abastecer suas baterias.
Criador incansável ele vê adiante do tempo, como acontece com muitos artistas de talento. Uma convivência demorada com ele exige paciência. Isto é comum nas pessoas muito ativas, porque o time delas é diferenciado. Atropelam as coisas com naturalidade.
Leonel parece com o galo que pinta em várias situações. Altaneiro, ligeiro, bondoso, solidário e também provocador. Colorido e vibrante, é visto de longe por todos que têm a oportunidade de admirar sua plumagem multicolorida. O seu canto é dobrado e sua visão universal.
Quando vou a uma exposição de Leonel saio gratificado porque sabe mexer com os sentimentos e a sensibilidade dos seus muitos admiradores. Lembro especialmente dos labirintos criados no Museu do Unhão com a Caixa Preta, onde expôs vários e vários cartazes com pinturas e textos rápidos. Levei duas horas percorrendo aqueles labirintos e lendo muitas das coisas que escreveu naqueles imensos papéis para que pudesse entender toda sua história de vida recente. Acompanhei, com seu irmão João, um bom período de sua trajetória, especialmente nos momentos difíceis, muitos dos quais estavam ali representados ou lembrados em seus textos. Quando esteve afastado do nosso convívio escrevia cartas e mais cartas. Tenho algumas delas guardadas. São cartas feitas em pedaços de papel, rasgados, recortados. Textos sem obedecer lógica ,estética, gramática ou qualquer coisa. Como um ribeirão em dia de enchente ,que vai levando tudo no seu caminho, assim ele colocava para fora o que estava sentindo. Uma revolta incontrolável. Lembro que depois de algum tempo alguém me procurou dizendo que Leonel queria as cartas. Evidente, que não as devolvi ou mesmo emprestei, porque não mais lhes pertenciam. Elas foram escritas num tempo, numa circunstância horrível que não valeria a pena ficar remoendo.
Estava ainda escrevendo este texto quando recebi um e-mail de Leonel. Mais uma vez estava indignado com as pichações e mesmo com os grafites de gosto duvidoso, muitos feitos em locais impróprios. Inconformado, lembrou de várias ações recentes tidas como culturais que atentaram contra artistas e suas obras. Este é o cidadão que conheço e que não se cansa de protestar, quando se deve protestar. E, ele leva o seu protesto para várias pessoas através de e-mails, telefonemas e conversas reservadas
Num episódio recente, seu filho viajou para Madrid com o objetivo de passar uma boa temporada com a mãe, que reside por lá. Chegando ao aeroporto, em Madrid, o menino foi detido juntamente com vários outros brasileiros. O Brasil que já recebeu tanto espanhol quebrado, durante a II Guerra Mundial, agora em retribuição se negam a receber brasileiros. Leonel fez uma confusão tão grande que um diplomata ficou preocupado e decidiu ajudar na solução do impasse. Leonel denunciou nos jornais, televisões, entrou em contato com autoridades, até que o menino pode desembarcar em paz. Este menino é meu afilhado, de coração , embora sempre houve desencontro para marcarmos uma data precisa para o batizado. Hoje, talvez, o menino já rapaz, nem queira ser batizado. Leonel portanto, é o compadre que não tive, porque o padre ainda não benzeu o menino. Faço votos que ele se dê bem por lá, estude e seja feliz junto da mãe.
Alguns meses atrás encontrei o Leonel e começamos a conversar. “Sabe compadre, agora estou fazendo trilha. É um grupo massa. Os caras têm uma solidariedade e alegria contagiantes. A gente viaja para a Chapada Diamantina, aos arredores da Grande Salvador e em vários municípios em busca de aventura. É uma festa! Tenho enfrentado obstáculos inacreditáveis. O Jeep fica parecendo que vai virar, atola nos riachos e na areia e todo mundo vem ajudar. Você podia comprar um Jeep, ou mesmo ir com esta camionete que é 4x4. Garanto que vai ficar viciado nas trilhas. Leve também Darcy”. Quem? Indaguei. Darcy? Imagine Darcy tomando tombo nessas trilhas sem asfalto. No asfalto com ar condicionado ela ainda se queixa da viagem, quanto mais nas trilhas. Nem pensar. Mesmo porque estas aventuras são coisas pra jovem ou coroas descolados.
Inconformado, Leonel discorreu sobre as delícias, a comida, a cervejada e a alegria de estar em lugares desconhecidos. Fiquei animado com a conversa, mas, não me via enfrentando uma trilha sem asfalto com Darcy ao meu lado. Certamente, que eu iria gostar das trilhas, porém, recusei o convite por razões óbvias.
Passados alguns meses voltei a encontrar com Leonel. - E ai, e as trilhas? “ Compadre, quase não mais andei nas trilhas. A mulher começou a não gostar , a se queixar dos tombos , de maneira que tem algum tempo que está em compasso de espera”
Lembrei de uma observação que fiz, conversando com amigos, que os homens gostam muito de encontrar com homens e ficar horas e horas batendo papo em botecos, jogos de futebol e outros locais ditos masculinos. Somos capazes de ficar horas e horas jogando conversa fora, falando de trabalho, mulheres, futebol, trilhas, casos engraçados envolvendo os interlocutores, gozações. Enfim, saem mil assuntos que vão se estendendo, consumindo tardes e noites sem a preocupação de ir embora. Quando alguém lembra que está ficando tarde o protesto é geral.
Mas, invariavelmente, quando a gente chega em casa tarde, encontra a companheira com cara zangada, pensa logo que tinha outra mulher no pedaço. Nada disto, era conversa besta de marmanjos que curtem se encontrar e conversar sobre mil coisas, às vezes sem qualquer conteúdo.

COMPORTAMENTO - COMPLEXIDADES

OPINIÃO
Texto de Reynivaldo Brito

A complexidade do ser humano é responsável por coisas positivas e muitas negativas. Confesso que não tenho a mínima paciência com pessoas que apresentam ou carregam um alto nível de complexidade. Elas não gostam do verde, do amarelo, do magro e do gordo, do frio e do calor. Enfim, vivem procurando encontrar algo que combine com seu mau humor e sua capacidade de discordar.
Conviver com pessoas assim exige muito sacrifício do parceiro ou da parceira. Também, carregam uma grande dose de individualidade. São donas da verdade, impõem limites em tudo e sempre estão dispostas a fechar a cara no momento em que deviam rir.
Uma das grandes dificuldades dessas pessoas é se colocarem no lugar do outro. Vou contar um caso : o Joaquim Silveira gostava de uma moça loira, olhos verdes, pernas finas e faladeira. Dessas que buscam aparecer a qualquer custo entrando na conversa alheia, usando vestidos berrantes, falando alto , e suas opiniões são como sentenças de um velho juiz. No trabalho sempre está tecendo comentários negativos contra colegas e invariavelmente pede ao interlocutor que guarde segredo. É tão viciada em falar mal dos colegas que muitas vezes é surpreendida por alguém que diz: fulana ,você já me contou esta história. Mesmo assim Maria Auxiliadora, este é o seu nome, não para de falar e continua a mostrar os defeitos do colega.Todos no escritório já conhecem este seu jeito de ser . Muitos até evitam parar para conversar com ela, e quando encontram alguém conversando com Auxiliadora já sabem que estão cortando a vida de alguém.
No trabalho gosta de participar, quando não organizar festas , porque o sucesso ou mesmo fracasso dos mesmos são pratos cheios para comentários malediscentes e assim revigora o seu cardápio. Um fato, por mais simples que seja, é o suficiente para um mês de conversas e briguinhas . Quase sempre os colegas estão com despeito, são invejosos e até fala em discriminação de gênero.
Mesmo causando estes transtornos não abre mão de participar das festas e encontros . Ocasião em que aproveita para manter contato com a mídia, quando aparece dando opiniões e entrevistas sobre os mais diversos temas. Como um trator vai atropelando tudo que passa em sua frente, mesmo os seus chefes ou pessoas devidamente credenciadas para tratar de determinados assuntos.
Tem dentro de si um elevador ,o qual a todo instante sobe e desce com presteza suíça. Quando está no alto, olha tudo na ponta do nariz e não enxerga ninguém. O Joaquim já foi esquecido há muito tempo e, agora o foco é a reunião do momento. Ri e beberica nos coquetéis, faz mesuras para os poderosos, dá um jeito de visita-los nos gabinetes, presenteia secretárias para ter acesso mais fácil e, assim, constrói um falso mundo de amizades. Quando chega no pique, no último andar, é hora do elevador descer, ai entra em choque com a crua realidade culpando a inveja. Para ela é preconceito , acha que colocaram feitiço, sente-se mal, mas, nunca vai ao médico, porque no fundo sabe que este sentimento é fruto de sua arrogância e extravagância.
Essas pessoas são eternas vítimas. Aprontam “ torto e a direita” e de repente caem na depressão e passam a culpar os outros. Se têm algum companheiro ou companheira é o culpado ( a) de tudo de ruim que acontece ou que imagina acontecer. Ficam prostradas por algum tempo até chegar ao fundo do poço do elevador.
Porém, em pouco tempo ressurgem, e quando chega este momento, saia de baixo ! Chegam como verdadeiros tratores de esteira passando por cima de tudo. A instabilidade emocional dessas pessoas não as permitem ter uma vida tranqüila , amar e ser amadas como acontece com qualquer ser que tem alguma estabilidade. Lembro de uma palestra que alguém assistiu onde um psiquiatra dizia que “feliz daquela pessoa que tem a cabeça no lugar”. Realmente é uma riqueza inesgotável os que tem serenidade para enfrentar o dia-a-dia, com a postura de alguém que sabe o que quer e sabe discernir.