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O chato de esporas passeando pela Cidade. |
Federal irem às redações dos veículos de comunicação entregar correspondências devidamente protocoladas sobre os mais variados assuntos. Na maioria das vezes anunciando alguma comemoração de datas históricas, a posse de um novo comandante, a visita de um ministro militar ou mesmo proibindo a divulgação de algum fato envolvendo ações realizadas no combate ao terrorismo ; uma ação bem sucedida contra a chamada luta armada, praticada pelos terroristas de esquerda ou mesmo a participação de um militar em um fato.
Lembro que certa vez um agente PF chegou à redação do jornal A Tarde, que ficava no primeiro andar, no prédio onde hoje funciona o luxuoso Hotel Fasano, na Praça Castro Alves,em Salvador, Bahia, trazendo um desses documentos. Ao me avistar dirigiu-se a mim para assinar o protocolo.
Normalmente quem ficava chefiando a redação no período vespertino era o saudoso jornalista Antônio
Maria de Brito Cunha, que era uma pessoa de fácil convivência e levava aquela
situação com certa fleuma. Aconteceu que naquela tarde o Brito Cunha ausentou-se,
não lembro a razão, e o agente se dirigiu a mim com o livro do protocolo já aberto quase que exigindo que o assinasse, confirmando o recebimento do comunicado. Foi
ai que recusei , e ele não gostou . Em tom de ameaça disse que iria falar com o coronel Luiz Arthur. Eu respondi
que podia falar, e apontei para o
telefone que ficava em cima de uma das mesas de madeira .
Afastei-me do agente até que ele
conseguisse se comunicar e não sei o conteúdo do diálogo. O agente fechou e
livro e retornou para sua sede que ficava na Cidade Baixa. A imprensa em todo o
país estava sob censura, mas já surgia daqui e dali alguma reação. Lembro que nesta mesma época surgiram as
máquinas de Xerox, e um desses comunicados foi xerocado em várias cópias as quais foram jogadas
de cima de um dos prédios na Rua Chile. Naquela época a Rua Chile era muito
movimentada, tinha um comércio intenso .
Muita gente saiu correndo para pegar uma cópia querendo ler o conteúdo do Comunicado que depois fiquei sabendo era a censura de uma Operação sigilosa da
PF.
Tinha um chargista no jornal de nome Eduardo Carvalho, já falecido, que era muito criativo e brincalhão. Conhecido carinhosamente por Dudu ele resolveu juntamente com o Brito Cunha fazer umas esporas de papelão utilizando as capas que serviam para proteger as bobinas de papel onde o jornal era impresso. Eram grandes folhas em forma circular ( usadas como proteção das laterais das bobinas de papel jornal ) e bem resistentes. Ali ele desenhava e recortava para criar as esporas. Essas esporas eram coladas nos calcanhares dos visitantes chatos que diariamente procuravam a redação do jornal. Alguns eram assíduos e enchiam a paciência dos redatores e repórteres que queriam trabalhar. Naquela época não tinha a rigidez e o controle que existe hoje para você acessar uma empresa ou um jornal. Assim, pessoas do povo, profissionais liberais que trabalhavam naqueles prédios da Rua Chile e imediações, e mesmo vindos de outros locais da Cidade compareciam para fazer uma reclamação ou levar uma carta para publicar na seção de Opinião do Leitor. Outros iam cobrar e saber o porquê da sua carta ainda não ter sido publicada. Isto acontecia com frequência porque naturalmente era feita uma seleção daquelas que tinham algum interesse para o cidadão ou a Cidade.
Foi ai que surgiu a ideia da espora. Os chatos foram os primeiros a ganhar suas esporas. Enquanto alguém conversava com o chato para distraí-lo outro se abaixava e fixava a espora no sapato através de uma fita adesiva. Concluída a operação da fixação da espora, restava aguardar o seu desfile.
O esporado saia do jornal e
invariavelmente subia garbosamente com sua espora pela Rua Chile, e a gente
ficava observando das janelas laterais da redação para ver a reação das pessoas
ao ver o esporado Era muito divertido porque um soldado, um agente ou mesmo um visitante chato, às vezes
vestido de paletó e gravata ou fardado esporado
quebrava a monotonia da tarde na redação.
Esta reação singela era uma forma
de demonstrar que àquelas pessoas não eram bem-vindas à redação do jornal .
7 comentários:
Eu entrei para a Redação de A Tarde, na Tancredo Neves, em novembro de 1976, e trabalhei com dezenas de grandes jornalistas, mulheres e homens, com os quais aprendi muita coisa, e ouvi muitas estórias e coisas da história. Os casos dos esporados eu ouvi logo que comecei a trabalhar, até que, anos depois, os saudosos jornalistas Wilson Barbosa e Brito Cunha resolveram ressuscitar as tais esporas, mas numa situação política diferente da qual o professor Reynivaldo narra nesta sua postagem. Mesmo assim era muito engraçado, aquelas pessoas andando pela Redação com esporas em um dos pés. O diretor de Redação, Dr. Jorge Calmon não aprovava, também não impedia. Boa lembrança professor.
Voce foi longe no tempo!!
Grande e graciosa recordacao!!!
Valmir Palma Ferreira
Certa vez fui escalado por Wilson Barbosa e consegui colocar um espora dourada, linda, no deputado Miguel Abrão. O colunistas de Militares, Raul Barreto, também foi nossa vítima, mais de uma vez!
Raimundo Vasconcelos
Maravilha!
Menandrro Ramos - Além das esporas, havia outras modalidades de gozação, como a moeda com espoleta pregada nas costas de uma foto de mulher nua, o copo de cafezinho com líquido pela metade colocado na parte superior da porta do sanitário para dar um banho de café no descuidado, além do famoso beijo no cangote, praticado por Jeoová de Carvalho. Mas, isso já na sede nova.. Na sede antiga , fui poucas vezes.. Tudo isso faz parte do antológico acervo do jornalismo baiano !...
Essas histórias merecem ser resgatadas. Os antropólogos e sociólogos d futuro vão ter um rico material para análise...
Antônio Queirós- Muito legal. Me lembro.
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