Objetivo


sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

PELOURINHO, UM MUNDO DESCONHECIDO - Parte 1

O aviso afixado nesta porta nem sempre é respeitado . As mulhres ficam postadas
 nas portas das casas residenciais atraindo seus "clientes".

JORNAL A TARDE - 26 DE AGOSTO DE 1971 - SALVADOR - BAHIA 
Texto de Reynivaldo Brito e Francisco Viana . Fotos de Magno Cardoso
Entrar no Maciel é fácil,sair é que são elas - diz a filosofia dos moradores daquele mundo estranho e desconhecido.O Maciel onde nem o sol traz alegria tornou-se conhecido pela presença marcante da prostituição proletalizada e a marginalização de seus moradores - 1.980 pessoas - que lutam contra a pobreza e vivem a certeza de uma existência sem perspectiva.

Esse quadro é consequência das crises econômicas registradas na Bahia no século passado que condicionou a desvalorização daquela área de construções coloniais. Onde outrora morou a fina flor da sociedade baiana foi deslocada com o crescimento da Cidade estão hoje ocupadas por prostitutas,famílias pobres e marginais. Levadas pela vantagem de aluguéis baratos centenas dessas pessoas começaram a habitar o Maciel.

A falta de condições de trabalho, a fome a a busca de emprego concorreram decisivamente para a marginalizção dos moradores que agora estão sendo cadastrados pela Setrabes e a Fundação do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia. Os projetos prevêem a integração dos habitates do Pelourinho,que compreende também toda a zona do Maciel os quais deverão trabalhar em centros cooperativo de artesanatos. A área será transformada em local de atração turistica e seus moradoes terão maiores condições de sobreviever honestamentee com melhores perspectivas de vida. É o Plano Geral de Recuperação do Pelourinho que já está sendo executado por operarios, sociólogos,antropólogos, arquitetos, etc.

O tipo de estrutura arquitetônica do casario colonial que permite a formação de moradias coletivas , em quartos que se multiplicaram com as divisões em tabiques e degradação social e a ação repressiva da polícia de costumes foram os fatores que forçaram o estabelecimento do meretrício na área do Pelourinho. Já nos anos 30 a  população do Maciel que está incluida na área do Pelourinho apresentava uma aglomeração considerável , que se consolidou no que é hoje envolvendo não apenas o problema da prostituição, mas todas as atividades diretamente a ela ligadas e dela derivadas.

O sociólogo Gey Espinheira responsável por um trabalho de pesquisa realizado naquela área afirma "que a prostituição representa um dos extremos mais baixos na escala hierárquica de valorizção social, e uma das mais rentáveis dentre aquelas que dispensaram uma formação sistemática para ser exercida principalmente para as empresas e agências de  prostituição em ocupação definida e regulamentada e até poderá organizar-se como uma grande empresa". Mas o problema daquela áea não é apenas a prostituição que a permeia. Outros problemas também cruciantes afetam e esmagam seus moradores.São homens, mulheres e criancinhas inocentes que estão marginalizados à espera de uma solução.

FORMAS DE PROSTITUIÇÃO

Na área do Pelourinho tem algumas formas de prostituição.1- a individual que é independente e autônoma. 2-Os bordéis - considerados pelos sociólogos e antropólogos - como organizações comerciais que proporcionam divertmento e promovem uma associação entre o "cliente" e a prostituta com venda de bebidas, alimentos, estimulantes e tóxicos, e a este sistema está intimamente ligado a indústria de diversões e a vida noturna da Cidade.

Essas e outras organizações localizadas na zona do Maciel transformam a prostituta em assalariada . E a possibilidade de trabalho sem agentes intermediários é cada vez mais difícil. Nos bordéis o "trabalho" se inicia às 8 da noite e vai ao amanhecer do dia seguinte. As mulheres recebem um percentual das despesas realizadas por seu "cliente" e a taxa correspondente à relação sexual da qual uma parte é destinada ao pagamento do aluguel do quarto que lhe foi alugado pela organização.

Durante o dia elas expõem os seus corpos semi-desnudos aos olhos dos transeuntes que por ali passam. Os passantes que são atraídos são levados para as "casas-de-cômodos", "trabalhando" elas independetes , até que apareçam os gigolôs que têm uma presença marcante naquela área marginalizada . É ele o agenciador da prostituta do Maciel e muitas vezes tem um contato de afetividade para com ela, mas leva quase todo o dinheiro por ela conseguido em suas relações.

A prostituta individual e independente antes exercida em grande escala naquela área está desaparecendo porque a tendência é a agloeração e a transformação daquelas prostitutas em assalaridas. Os bordéis  e as casas de encontro , castelos, bares, "protetores" e todo um sistema de corrupção e suborno envolvem a prostituição do Maciel.

3-A prostituição de castelo já é diferente da praticada no bordel porque a sua estrutura interna tem um caráter menos comercial e o "trabalho" é realizado obedecendo uma regra através de contatos pessoais entre seus atores. 

Sabemos que a prostituição se manifesta de várias formas com relação à organização , mas o caso específico do Maciel é de organização prostitucional proletarizada e assume características de meretrício extenso. Diz o sociólogo Gey Espinheira qoe "os ambientes prostitucionais caracterizam-se também pela maior ou menor concentração de pessoas que se dedicam à prostituição".

4- As casas-de-encontro são dedicadas a acolher pessoas que procuram um lugar para se associaram sexualmente e a adminitração é exercida por uma pessoa que é encarregada  de cobrar os aluguéis dos quartos . A rigor estas casas existentes no Maciel funcionam como pequenos hóteis cujos quartos são alugados por tempo curto regulado por base na duração de um encontro.Contudo estes modelos mencionados quase nunca são puros e ainda existem outros com misturas de características.

A RECRIMINAÇÃO SOCIAL

A sociedade brasileira em geral e particularmente a baiana despreza e maginaliza a prostituição.Mas ela existe e é parte interessante do sistema social e permanecerá enquanto exisstireem as formas institucionalizadas de monopolização da conduta sexual pelo casamento.

Entendem os sociólogos que a prostituição é uma ocupação econômicamente legítima e não uma conduta sexual imoral de um grande número de pessoas. A sociedade a condena, despreza, e isola permitindo sua prática dentro de limitações . Por causa da impossibilidade de solução do problema ela passa a funcionar como um mecanismo de defesa da própria sociedade. É o lado oposto do oficial da conduta sexual representada pelo casamento. 

Se compararmos os níveis de renda média dos trabalhadores da indústra baiana e o nível médio de renda das prostitutas do Maciel notamos que esta é uma das ocupações mais rentáveis ( embora condenável ) e a integração dessas pessoas com o sistema econômico é uma das mais efetivas por representar um pode aquisitivo médio alto em relação à grande maioria dos trabalhadores assalariados.

AS ÁREAS 

O meretrício que difere das demais formas de prostituição pelo caráter de grupo extenso , aglomeração de  unidades empresariais , agências além de mais diversas formas incluindo a prostituição individual se organiza independentemente . O que existe no Maciel é um processo comunitário separado, resultante da pressão do sistema de valores da sociedade circundante ou da livre armação das forças econômicas.O Pelourinho é um triste exemplo da  zona deteriorada levemente afetada pelo crescimento da Cidade.

Os bares, boates e outros estabelecimentos similares ,localizados naquela área têm preços superiores aos de estabelecimentos semelhantes localizados em outros pontos de Salvador. 

Os encarregados da proteção individuaal e das agências com base em esquemas de subornos, corrupção, chantagem, venda obrigatória de proteção,além do mercado clandestino de entorpecentes e psicotrópicos , estão aí atuando livremente.

As ruas Gregório de Mattos, João de Deus, Bêco do Mota, Ignácio Aciolli,Frei Vicente  dentre outras, estão localizadas naquela área. Nos dois últimos anos de acordo com o relatório de uma pesquisa de autoria do citado sociólogo houve um aumento de 8,69% do número de prostitutas residentes naquela área. O crescimento global da população foi de 11,5% .Embora a prostituição seja a atividade mais marcante e representa apenas 40% da população ali residente.Das famílias entrevistadas notamos uma média de seis pessoas por cada grupo familiar e se caracterizam pelo baixo nível de instrução e precárias relações com o sistema de produção.

O quadro geral do nível de instruçção dos moradores do Pelourinho poderá ser assim resumido: Analabeto, primário  incompleto e completo dos homens.,79,8%e das mulheres 82,10%. Ocupações:lavrador (pai) 38,05% e mãe 34,38%; ocupaçãos sem funções definidas 20,90% e 34,33%; semi especializados 63,43% e 29,8%; pequeno comerciantes 8,95% e5,98%; sem ocupações 5,23% e 16,42%. Este quadro mostra a relação existente entre o nível educacional que é baixo, e o despreparo profissional dos moradores.

As 1.980 pessoas residentes no Maciel , assim responderam aos entevistadores : Por que vieram residir ali ? 16,42 % que vieram porque teriam emprego certo; 17,92 % em busca de trabalho; 11,94% porque a família resolveu mudar e tiveram que acompanhar; 8,95%a convite de amigos; 27,61% para exercerem a prostituição e 17,16% nasceram em Salvador e não souberam explicar.

Deixando as famílias ou se transferindo com elas essas pessoas compõem atualmente o quadro ocupacional do meretrício do Maciel movimentaram-se em procura de melhores condições de vida e trabalho que não poderiam ser encontrados em suas cidades ou locais de origem.

É UMA POPULAÇÃO JOVEM

A conclusão que se chegou é de que a população ali residente é constituida de uma população predominantemente jovem e que vieram para Salvador - aquelas pertencentes ao gupo prostitucional  apresentavam este quadro com relação às idades de 12 anos 13,4%; de 13 a 15 anos 17,91%;de 16 a 17 anos 17,91 %: de 18 a 23 anos 26,11%, de 24 a 29 anos 5,97% e de 30 anos a mais 1,5%.

Porém, 19,2% dessas pessoas vieram para Salvador com idades inferiores a 18 anos e hoje apresentam idade inferiores a 30 anos. 

O PROBLEMA DA SAÚDE

Entre os entrevistados 69,4% não fazem exame médico de nenhum tipo e 20,10% o fazem irregularmente . Outras fazem com intervalos quinzenais e mensais.

As mulhres do Maciel têm uma renda variável entre Cr$241,00 a Cr$ 840,00 o que equivale a 94,02 % e as demais ganham em torno de Cr$121,00 a Cr$239,00.

A alimentação é outro problema enfrentado por aqueles moradores ( em muitos sentidos) não só pela pequena quantidade consumida, como pela inadequação dos alimentos pois gastam menos na alimentação do que com a habitação deteriorada. A alimentação é na base de pequenos lanches nas cantinas e bares localizados na zona, ou de marmitas cujo conteúdo não é satisfatório.

Das 1.980 pessoas residentes na zona do Maciel é esta a estratificação social: Menores de 18 anos 691; adultos economicamente dependentes 46; pessoas do sexo feminino 781 e do sexo masculino em idade ativa ou para o trabalho é de 442 indivíduos, distribuídos em 24 categorias ocupacionais distintas. Existem 23% de comerciantes, 15,1% de ambulantes; 7,4% pequenos comerciantes; 5,0% de biscateiros, perfazendo um total de 50% dos moradores . Das 24 categorias existentes  - sendo estas 4 principais - as demais apresentam concentrações menos importantes, embora ocupem 49,5 %do total da população masculina.Essa parcela populacional se caracteriza por ocupações que não se definem como específicas desses indivíduos, e sim por serem exercidas de forma improvisada.

Já a população feminina em idade ativa é de 781 pessoas , distribuídas em 12 categorias ocupacionais , sendo que a prostitucional, absorve 57,6% e as demais estão nas 10 categorias restantes, e não apresentam concentrações . Segundo declarou o sociólogo Gey Espinheira " as ocupações femininas encontradas no Maciel  são típicas dos centros urbanos possuidores de áreas congestionadas , onde se concentram populações pobres e marginalizadas. Entretanto, a prostituição se constitui em categoria à parte., embora a localização do meretrício seja também em decorrência específica deste tipo de área.. Das ocupações encontradas a que apresenta maiores indícios de integração com a sociedade é a prostituição., definida e regulamentada pelos órgãos encarregados dos costumes, embora seja a ocupação condenada pela sociedade".

Os menores dependentes encarregam-se de serviços auxiliares à economia doméstica que envolve todos os membros da família em realização de serviços, a fim de que seja possível aumentar a renda familiar.As crianças participam na medida em que podem ,neste processo de auxílio aos adultos tornando-se seu trabalho uma das características da comunidade do Maciel.

UMA VIDA DIFERENTE

Zona do Maciel : centenas de pessoas se amontoam como que por um milagre em cortiços imundos e ruas de calçamento irregular e cheias de buracos. É a morada de prostitutas , maconheiros, malandros, camelôs, comerciantes, desempregados e de criancinhas que vivem marginalizadas e padecem de fome e miséria. Sua rotina é fome, gritos, palavrões e desgostos.- Sai daí moleque do diabo. Vai abusar sua mãe - é uma prostituta velha que reclama - Você não quer comprar um relógio "Seiko"novinho ? - é um camelô que "ataca". Para um sujeito bem vestido que passa apressado- Hoje o prato do dia é fígado. Vem comer aqui mulher.- é a gerente do restaurante popular que convida uma desconhecida para o almoço. 

- Aqui é casa de família meu senhor. Procure outro local e saía da minha vista - é uma senhora idosa que protesta ante a presença de um rapaz magro que confundiu sua residência com uma casa de prostituição.

- Lá vem a cana - é o aviso de um malandro que passa correndo dentro da noite avisando a outros a presença de uma viatura da Polícia que fazia uma "batida" rotineira- No Maciel moram, trabalham,vegetam e vivem  isolados do resto do mundo 1.980 pessoas pouco importa para eles o que acontece no resto do " mundo exterior"  ( tudo que não faz parte da zona do Maciel ). A única diversão é comentar com ironia a vida das prostitutas brigas e prisões feitas pela Polícia nos bares e botequins. Quando o sol nasce diminui o movimento no mundo do Maciel, mas muita gente fica trabalhando em salas imundas , bares, restaurantes e casas de prostituição , alfaiatarias ou quitandas. Uns vendem doces e balas, costuram ou vendem frutas . Consertam aparelhos elétricos ou simplesmente esperam que passe algum sujeito displicente para lhe bater a carteira. E nessa rotina levam quase toda a vida pois "no Maciel é muito fácil de entrar , sair é que são elas", na filosofia vulgar das prostitutas.

O CONSERTADOR DE GUARDA-CHUVAS

Estas criancinhas que nasceram sob o signo da miséria ainda poderão
 ser recuperadas através o projeto da Comunidade do Maciel.
 Uma iniciativa que vem clarear a vida de centenas de seres humanos. 
Das criaturas mais difíceis de se manter um diálogo e de conhecer a sua filosofia de vida na zona do Maciel é Jorge Urbano de 34 anos . Aos quatro anos de idade chegou para a zona e ali cresceu vendo sempre a vida andar mal para a sua família. Não teve tempo da estudar e para ajuda em casa teve até que pedir esmola. Assim sentiu que " a vida é um negócio bom para quem tem dinheiro" e aprendeu o ofício de consertador de guarda-chuvas, com o qual garante alguma coisa na panela todos os dias. 

Jorge tem seis filhos, morava numa lojinha apertada e ganhava em média de Cr$2,00 a Cr$3,00 por dia . Viveu sempre doente e sua maior mágoa foi não poder dar educação aos filhos: "Não tive condições para salvar meus garotos da minha sina miserável". O dia de Jorge é sempre igual. Com paciência e utilizando-se de uma tesoura velha e das próprias mãos vai consertando guarda-chuvas  dos mais variados tamanhos e dos mais diferentes donos. Nunca cobra mais de Cr$1,00 pois a "freguesia é pobre" e na maioria das vezes segue a risca o ditado que diz :"Guarda-chuva de pobre é cachaça"Fome total Jorge nunca passou. Mas é comum na sua casa faltar alimentos necessários à boa alimentação como leite ,carne,ovos e pão. Meio-dia é sempre hora de azar para Jorge e sua família : o arroz , o taco de carne e a farinha ,sendo que a maior parte é dividida entre as crianças que "precisam comer mais do que os mais velhos". Talvez por não ter aprendido outra profissão, em ter conseguido estudar é que Jorge não gosta de falar de sua vida. É desconfiado e sempre que lhe perguntam alguma coisa ele responde de má vontade : - só posso afirmar uma coisa: nunca roubei nem matei".  

Aos 34 anos Jorge não vê perspectiva de sair do "lodo em que há muito já afundou". Sua filha de 14 anos é a única da família que está estudando,graças à boa vontade das professoras e de alguns dos seus fregueses que lhes dão livros e dinheiro para o transporte. O maior orgulho de Jorge é possuir uma geladeira em casa. -Enfim - diz ele - a gente é miserável ,mas precisa ter alguma coisa que nos pertença e que amanhã possa "safar" uma situação difícil."

O FAZEDOR DE BANDEIRAS

Seu nome: Ezlimar Geraldo Félix, idade 24 anos. Sua profissão: fazedor de bandeiras. É um paraibano miúdo, de olhar vivo e cordial. Ao contrário da maioria dos trabalhadores do Maciel é pouco modesto e vive dizendo que "não há no mundo quem faça melhores bandeiras que eu". Chegou à Salvador a seis meses e como não encontrou moradia fácil nem lugar para trabalhar " sem receber gritos do patrão" foi morar no Maciel. Em sua terra natal o maior capital que conseguiu reunir foi Cr$100,00 que aplicou tudo no feitio de bandeiras e na pintura de camisetas que os torcedores dos clubes ostentam nos dias de jogos.

Ezlimar trabalha no primeiro andar do Beco do Mota, número três, em meio a tintas , pedaços de madeira e muito barulho.  Não gosta muito que se fale mal do Vitória - o time do seu coração - na sua presença e cobra pelo seu trabalho de acordo com a personalidade do cliente. Se é um rapaz jovem e inexperiente ele nunca vende uma bandeira por menos de Cr$5,00e vai logo dizendo :"É do melhor pano e só o sinhô vendo o trabalho que dá para fazer".Quando o cliente é de certa idade e gosta de fazer exigências torna-se humilde, reconhece que o trabalho está bem feito , mas um pouco caro e acaba vendendo mais barato.

Na vida Ezlimar conhece quase tudo: já foi camelô, lavador de pratos, garoto de recados e já passou muita fome.No início deste ano resolveu vir morar na Bahia, pois segundo ele "na Paraíba o mercado de trabalho é ruim, e quem é pequeno morre com a boca cheia de formiga". Aqui trabalhou duro e o seu trabalho deve ter rendido bem, pois em menos uns meses conseguiu alugar uma casinha na Cova da Onça ,bairro de Nazaré,onde passou a morar com a família.Ganha em média Cr$400,00 por mês e só vai para o Maciel para trabalhar.

Ele mantém quatro camelôs trabalhando na rua. Vendem camisas pintadas com escudos do Bahia e do Vitória,Galícia e Fluminense , entre outros times por Cr$5,00 .Recebem encomendas para bandeiras e faixas. Há meses que chega a receber mais de 1.500 encomendas ,mas acha que não ganha o suficiente. Gostaria de ter uma profissão,mas desde crianças que sua vontade de estudar morreu : a família pobre nunca lhe deu condições  para frequentar os bancos escolares.

Casado e pai de duas  filhas Exlimar dá um sorriso alegre quando dizem que o Pelourinho vai ser reformado e que a vida no Maciel vai melhorar muito. "É bom moço ,trabalho aqui há pouco tempo, mas já tenho diploma das privações desse lugar. Basta dizer que passo aqui mais de dez horas por dia. Só vou pra casa na hora de dormir. Pois se vejo as minhas filhinhas não tenho outra vontade senão de ficar brincando com elas.  Depois da reforma é provável que instale meu "fabrico" de bandeiras e a minha casa, aqui mesmo no Maciel.

A GAROTADA VAI À ESCOLA

Quando o sol nasce as crianças do Maciel vão à escola do professor Anibal dos Santos .São figuras magras , que gostam mais de brincar do que pegar nos livros e que nasceram com vocação de progresso como todas as outras crianças da sua idade, mas que crescem marginalizadas por causa da profunda miséria que se faz presente no mundo do Maciel, onde nem o sol traz alegrias.

Usando cadernos oferecidos pelo próprio Anibal as crianças - em número superior a 80 - se revezam por três turnos, na Escola São Jorge. Sentadas  em banquinhos de madeira sem nenhum conforto ouvem palavras de incentivo, reclamações e dão a mão a palmatória quando cometem erros nas lições ou não prestam atenção à aula.

-Trabalho assim, porque fui criado na base da palmatória e hoje sou uma pessoa de bem. A voz do professor Anibal, de 38 anos, soa baixo.Começa falando das suas dificuldades : paga Cr$200,00 de aluguel na casa onde funciona a Escola São Jorge e o proprietário quer aumentar para Cr$300,00. Cria 7 garotos , a que chama de "meus filhos"e cobra em média de Cr$5,00 por aluno mensalmente.

- Minha família é de gente bem e brigam quando digo que os meninos são meus filhos .Se falo assim é porque não me casei e preciso dedicar o meu tempo e afetividade à alguém . Veste roupa esporte , cabelos em desalinho Anibal dos Santos diz que o maior problema que enfrenta como educador é fazer com que seus alunos não cresçam com uma imagem negativa dos pais, que muitas vezes são obrigados a se prostituir para ganhar o pão de cada dia.

Terminou o curso normal em 1953 pelo Instituto Isaías Alves - ICEIA, que fica no Barbalho, mas a escola já vinha funcionando desde 1951.Como meu pai viajava muito e eu gostava de ficar sozinho em casa, vim morar aqui no Maciel em companhia de uma velha criada da família. O pessoal pediu para eu ensinar a alguns meninos a ler e escreve,r e assim eu comecei a escola. Hoje, já criei oito dos meus filhos e ensino a 80 alunos sem falar no curso de Inglês que criou mais novas vagas. Espero que com a reforma do Pelourinho a minha escola seja melhorada, pois se eu fechá-la não sei como vou fazer para viver." E noitinha e a Escola São José vai ficando vazia. O professor Anibal dos Santos diz que dois dos seus  alunos estão de castigo e não podem sair. Um velho que mora na mesma casa reclama da conta de luz. E na rua já começa o movimento das prostitutas. Vai começar tudo novo: a rotina da noite na zona do Maciel. 

                                                                                                                                                                                                                                                                          

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