REVISTA MANCHETE
30 de abril de 1979
Na terra da Mãe Menininha de Gantois, ela também é rainha.
A ialorixá Olga de Alaketo é uma das mães-de-santo mais respeitadas do Brasil. Ela reina em seu terreiro no bairro do Luís Anselmo, em Salvador, onde exerce seu poder temporal e espiritual sobre diversas filhas e filhos-de-santo, ogans, ekedes e outros elementos integrantes do candomblé. Olga está com 53 anos de idade e tem dez netos. É uma negra bonita e Iansã é dona de sua cabeça. Dança divinamente e gosta de frequentar em companhia de gente da alta sociedade a vida noturna do Rio de Janeiro e São Paulo. Quando Denner estava no seu esplendor de mestre da alta costura, Olga de Alaketo exibia, frequentemente, sua etiqueta.
Como toda mulher, é vaidosa e gosta de se apresentar bem vestida. Porém, na hora de suas obrigações acontece uma brusca transformação: Olga recebe o seu santo e reina com toda sua autoridade em Alaketo, que em ioruba significa um pedaço do céu. É também apontada como a única ialorixá baiana que viaja pelo país fazendo trabalhos de recuperação de jovens toxicômanos. Já esteve várias vezes na África e participou como convidada especial do Festival Internacional da Nigéria. Embora tenha uma vida de rainha, ela está sempre sensível às necessidades de suas filhas-de-santo. E um exemplo disto aconteceu no último festival da Nigéria. Quando chegou ao aeroporto de Dakar, Olga foi informada que só haviam reservado acomodações para ela. Zangada, preferiu dormir no aeroporto, ao lado de suas filhas-de-santo, até que tudo fosse contornado.
Olga de Alaketo afirma que hoje em dia o candomblé é respeitado por muita gente. “É uma religião respeitada. Mas, por outro lado, muitos estão entrando indevidamente no assunto e alguns até se arvoram em pais e mães-de-santo e não têm nem uma conta lavada. Isto tira o real valor do candomblé, porque confunde as pessoas. Outro problema é a exploração desenfreada que está acontecendo por parte de alguns compositores, que colocam em suas músicas nomes de Orixás e mesmo de mães-de-santo. A esses, eu tenho a dizer que tomem cuidado com os exageros. Uma homenagem ainda se admite, mas daí o indivíduo passar a colocar em suas músicas ou composições parte de coisas do nosso culto é uma afronta e, acima de tudo, uma desonestidade que não podemos admitir. Não gosto desse tipo de coisa. Agora estão usando até trajes de iaôs (iniciadas) durante o carnaval. Para mim carnaval é carnaval e candomblé é candomblé. Não podemos permitir que o candomblé seja diminuído. É preciso que as coisas sejam colocadas em seus devidos lugares”.
Descontraída, Olga de Alaketo diz por que frequenta boates e restaurantes da moda. “Vou em boate, em restaurantes, teatros etc. Vou bem acompanhada e sei me comportar. E ainda tem mais, se tiver que dançar eu danço, e como!
Só não faço beber porque não gosto de bebidas. Sei com quem vou. Às vezes fumo um cigarro. Sei com quem saio e com quem volto. Não frequento esses locais com qualquer pessoa. Aí é que está o segredo: saber escolher as pessoas que você pode acompanhar.
Embora no mundo a gente termine se misturando com quem é bom e com quem é ruim”.
Olga não quis falar das discussões existentes em torno da seriedade ou não de muitos dos terreiros de candomblé espalhados pelo país, especialmente na Bahia. Disse que “sobre isto não posso falar” porque quase não conhece os outros terreiros. Conhece poucos o terreiro do Gantois, “onde já fui algumas vezes, porque minha mãe era contraparente da Menininha de Gantois e quando me chamam eu vou. Mas, não me meto nessas coisas. Acabou. Vou ainda na casa de Irene, que é filha do finado Felisberto Bomboché, que era africano. Conheço a raça dele toda na África. Eu o conheço há muitos anos porque fomos criados aqui, juntos. Agora aos outros não vou, porque não conheço as pessoas. Fico em minha casa onde recebo meus amigos e vou às festas para as quais sou convidada”. A seguir falou de seu candomblé. Mostrou o imenso terreno que pertence a Alaketo e diz que ali só podem reinar pessoas que são ligadas por sangue.
Sobre a violência no mundo Olga diz que “as coisas sempre existiram, mas eram mais reservados. Não era como agora, esses assaltos, essas coisas. Ontem mesmo vi quando cinco homens pegaram um rapaz que mora aqui ao lado para tomar-lhe dinheiro. O que me dói por dentro não é o roubo propriamente, mas a perversidade que estão fazendo com as pessoas. Pegam as pessoas, matam, fazem todo tipo de maldade. Acredito que esses meninos são doentes. São garotos que precisam de conselhos e tratamento. Muitas vezes são recalques que carregam e depois vão despejar em outras pessoas que nada têm a ver com os problemas deles. Os mais velhos dizem que os pais fazem para os filhos pagar. Eu acredito piamente nisto. Me lembro de uma pessoa que viveu muito bacana, mas que aprontou muita miséria para os outros. Essa pessoa morreu e seus filhos têm pago coisas que você duvida. O problema do tóxico mesmo é porque esses meninos vêem os pais deixando as mães, batendo nas mães e isto revolta as crianças que terminam por buscar a droga. Não tem coisa pior que um filho presenciar uma mãe ser espancada por quem quer que seja, principalmente pelo pai. Daí o tóxico ser uma fuga para esquecer esses problemas e muitos terminam viciados. Tenho cuidado de vários jovens e quando conversamos afloram esses problemas ou outros semelhantes. Mas estão pagando pelo que fizeram seus pais”.
– Muitos afirmam que “o candomblé mata e aleija”. D. Olga de Alaketo, o que a senhora acha disso?
– Bom, vou lhe explicar uma coisa. Não há médico que cure que não mate. Nem que seja por erro. É mesmo que o candomblé. Não há quem não cure que não mate. Às vezes, sem querer fazer por mal. Mas a gente está pedindo para o bem e só vem o mal. Quando vejo uma pessoa falando mal do candomblé, eu o deixo falar. O que não está certo é você generalizar. Há candomblés bons e ruins. Outro dia – continua Olga de Alaketo – eu estava assistindo à televisão onde alguns crentes estavam falando. Apareceu uma moça e disse que era de candomblé e havia abandonado o culto porque lá aprendera a tomar tóxico e resolveu generalizar que no candomblé se toma tóxico. Fiquei indignada porque essa moça deveria dizer onde foi que aprendeu a tomar tóxico, inclusive revelando o tal terreiro, já que ele existia, segundo ela. Ora, partir daí para generalizar é um exagero e uma atitude errada, porque os terreiros, em sua grande maioria, são locais de obrigações sérias e que merecem respeito. Eu não conheço nenhum candomblé que faça isso. Eu mesmo nem sei distinguir uma flor de maconha. Nunca vi, não quero ver.
Como toda mulher, é vaidosa e gosta de se apresentar bem vestida. Porém, na hora de suas obrigações acontece uma brusca transformação: Olga recebe o seu santo e reina com toda sua autoridade em Alaketo, que em ioruba significa um pedaço do céu. É também apontada como a única ialorixá baiana que viaja pelo país fazendo trabalhos de recuperação de jovens toxicômanos. Já esteve várias vezes na África e participou como convidada especial do Festival Internacional da Nigéria. Embora tenha uma vida de rainha, ela está sempre sensível às necessidades de suas filhas-de-santo. E um exemplo disto aconteceu no último festival da Nigéria. Quando chegou ao aeroporto de Dakar, Olga foi informada que só haviam reservado acomodações para ela. Zangada, preferiu dormir no aeroporto, ao lado de suas filhas-de-santo, até que tudo fosse contornado.
Olga de Alaketo afirma que hoje em dia o candomblé é respeitado por muita gente. “É uma religião respeitada. Mas, por outro lado, muitos estão entrando indevidamente no assunto e alguns até se arvoram em pais e mães-de-santo e não têm nem uma conta lavada. Isto tira o real valor do candomblé, porque confunde as pessoas. Outro problema é a exploração desenfreada que está acontecendo por parte de alguns compositores, que colocam em suas músicas nomes de Orixás e mesmo de mães-de-santo. A esses, eu tenho a dizer que tomem cuidado com os exageros. Uma homenagem ainda se admite, mas daí o indivíduo passar a colocar em suas músicas ou composições parte de coisas do nosso culto é uma afronta e, acima de tudo, uma desonestidade que não podemos admitir. Não gosto desse tipo de coisa. Agora estão usando até trajes de iaôs (iniciadas) durante o carnaval. Para mim carnaval é carnaval e candomblé é candomblé. Não podemos permitir que o candomblé seja diminuído. É preciso que as coisas sejam colocadas em seus devidos lugares”.
Descontraída, Olga de Alaketo diz por que frequenta boates e restaurantes da moda. “Vou em boate, em restaurantes, teatros etc. Vou bem acompanhada e sei me comportar. E ainda tem mais, se tiver que dançar eu danço, e como!
Só não faço beber porque não gosto de bebidas. Sei com quem vou. Às vezes fumo um cigarro. Sei com quem saio e com quem volto. Não frequento esses locais com qualquer pessoa. Aí é que está o segredo: saber escolher as pessoas que você pode acompanhar.
Embora no mundo a gente termine se misturando com quem é bom e com quem é ruim”.
Olga não quis falar das discussões existentes em torno da seriedade ou não de muitos dos terreiros de candomblé espalhados pelo país, especialmente na Bahia. Disse que “sobre isto não posso falar” porque quase não conhece os outros terreiros. Conhece poucos o terreiro do Gantois, “onde já fui algumas vezes, porque minha mãe era contraparente da Menininha de Gantois e quando me chamam eu vou. Mas, não me meto nessas coisas. Acabou. Vou ainda na casa de Irene, que é filha do finado Felisberto Bomboché, que era africano. Conheço a raça dele toda na África. Eu o conheço há muitos anos porque fomos criados aqui, juntos. Agora aos outros não vou, porque não conheço as pessoas. Fico em minha casa onde recebo meus amigos e vou às festas para as quais sou convidada”. A seguir falou de seu candomblé. Mostrou o imenso terreno que pertence a Alaketo e diz que ali só podem reinar pessoas que são ligadas por sangue.
Sobre a violência no mundo Olga diz que “as coisas sempre existiram, mas eram mais reservados. Não era como agora, esses assaltos, essas coisas. Ontem mesmo vi quando cinco homens pegaram um rapaz que mora aqui ao lado para tomar-lhe dinheiro. O que me dói por dentro não é o roubo propriamente, mas a perversidade que estão fazendo com as pessoas. Pegam as pessoas, matam, fazem todo tipo de maldade. Acredito que esses meninos são doentes. São garotos que precisam de conselhos e tratamento. Muitas vezes são recalques que carregam e depois vão despejar em outras pessoas que nada têm a ver com os problemas deles. Os mais velhos dizem que os pais fazem para os filhos pagar. Eu acredito piamente nisto. Me lembro de uma pessoa que viveu muito bacana, mas que aprontou muita miséria para os outros. Essa pessoa morreu e seus filhos têm pago coisas que você duvida. O problema do tóxico mesmo é porque esses meninos vêem os pais deixando as mães, batendo nas mães e isto revolta as crianças que terminam por buscar a droga. Não tem coisa pior que um filho presenciar uma mãe ser espancada por quem quer que seja, principalmente pelo pai. Daí o tóxico ser uma fuga para esquecer esses problemas e muitos terminam viciados. Tenho cuidado de vários jovens e quando conversamos afloram esses problemas ou outros semelhantes. Mas estão pagando pelo que fizeram seus pais”.
– Muitos afirmam que “o candomblé mata e aleija”. D. Olga de Alaketo, o que a senhora acha disso?
– Bom, vou lhe explicar uma coisa. Não há médico que cure que não mate. Nem que seja por erro. É mesmo que o candomblé. Não há quem não cure que não mate. Às vezes, sem querer fazer por mal. Mas a gente está pedindo para o bem e só vem o mal. Quando vejo uma pessoa falando mal do candomblé, eu o deixo falar. O que não está certo é você generalizar. Há candomblés bons e ruins. Outro dia – continua Olga de Alaketo – eu estava assistindo à televisão onde alguns crentes estavam falando. Apareceu uma moça e disse que era de candomblé e havia abandonado o culto porque lá aprendera a tomar tóxico e resolveu generalizar que no candomblé se toma tóxico. Fiquei indignada porque essa moça deveria dizer onde foi que aprendeu a tomar tóxico, inclusive revelando o tal terreiro, já que ele existia, segundo ela. Ora, partir daí para generalizar é um exagero e uma atitude errada, porque os terreiros, em sua grande maioria, são locais de obrigações sérias e que merecem respeito. Eu não conheço nenhum candomblé que faça isso. Eu mesmo nem sei distinguir uma flor de maconha. Nunca vi, não quero ver.
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