Revista Fatos e Fotos / Gente
Dia 22 de setembro de 1980
SINCRETISMO
As Águas de Oxalá nas escadas do Bomfim
Mil e quinhentas baianas, ricamente trajadas e carregando aos ombros jarras de cerâmica e prata, lavaram, no último dia 15, Dia de Oxalá, a escadaria e o adro da igreja de Bomfim, em Salvador, fechando o ciclo das festas populares da capital baiana. Um espetáculo de rara beleza que atrai milhares de pessoas, até do exterior, inclusive estudiosos, que vêem nesta festa o ápice do sincretismo religioso, ou seja, a união natural entre a Igreja Católica Apostólica Romana e o Candomblé, que é considerado por muitos como um culto fetichista.
A famosa lavagem começa com o tradicional cortejo que, saindo da igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, percorre toda a zona comercial, de onde são lançados papéis picados dos edifícios e estourados muitos foguetes. Os oito quilômetros que separam as igrejas do Bomfim e da Conceição são percorridos pelo povo que segue nos mais variados tipos de transporte, desde bicicletas a carroças, num clima de muita festa e euforia.
As pessoas de fora não sabem se a multidão quer realmente lavar as escadarias ou brincar o carnaval. O clima é de uma mistura – embora pareça contrastante – de fé e festa. O baiano reza e dança. Quando o cortejo atinge a colina sagrada, onde está a imponente igreja, pode-se ver a multidão dançando e cantando, ao lado de muitos outros que rezam. Ninguém censura ninguém. Tudo é aceitável e os turistas ficam extasiados com o clima.
Nesta última lavagem, vários turistas tentaram saber como as autoridades conseguiam aquela harmonia. A resposta do baiano é sempre a mesma: a fé, a vontade de brincar, além do próprio temperamento do baiano – uma mistura de fé, descanso e vontade de brincar, – capaz de dar valor a coisas insignificantes, não ligando às de volta.
No largo do Bomfim funciona um verdadeiro comércio, com 300 barracas que vendem desde o refrigerante até bebidas estrangeiras mais sofisticadas. Ao lado, dezenas de baianas vendem seus quitutes. Em plena festa, muitas trabalham batendo a massa para produção de novos acarajés e, de vez em quando, se levantavam e dançavam, acompanhando o ritmo da festa da lavagem da igreja.
A festa, depois da lavagem, prossegue até a quarta-feira de cinzas, uma vez que cada bairro de Salvador tem o seu grito de carnaval, antes da festa oficial, este ano, marcada para o início de março.
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