REVISTA MANCHETE NO.1354 10. agosto 1978
Foto Lázaro Torres
Milhares de sacerdotes em todo o país estão enfrentando graves dificuldades e alguns quase não conseguem o necessário à sua sobrevivência. Preocupada com essa situação, a Arquidiocese de Salvador montou um programa que visa a conscientizar a comunidade religiosa, que tem, segundo o cardeal primaz do Brasil, Dom Avelar Brandão Vilela, a responsabilidade de manter os serviços paroquiais. Esse esquema de apoio, que será definido num Plano Pastoral a ser desenvolvido ainda este ano e que prevê fundamentalmente inovações nas formas de arrecadação de recursos, já vem sendo aplicado em caráter experimental em determinadas paróquias, como a do bairro do Jardim Cruzeiro, área próxima dos Alagados, onde mais de cem mil pessoas habitam uma favela de palafitas. Objetivando a levantar os recursos para a conservação de seus imóveis e a sobrevivência dos sacerdotes, a Igreja vai desfechar uma campanha de âmbito nacional, embora inicialmente circunscrita a Salvador, para a obtenção das contribuições. Serão formados grupos especiais para realizar um trabalho de doutrinação, que tentará mostrar, em síntese, a necessidade de colaborar materialmente com a Igreja. “É preciso lembrar aos católicos que eles também são a Igreja. Esta não é representada apenas pelo Clero. Há uma co-responsabilidade, de fiéis e padres”, diz o bispo-auxiliar de Salvador, Dom Tomás Murphi,( foto) um dos coordenadores da campanha, na Baia.
O DÍZIMO
A instituição do dízimo é multimilenar. Já no livro de Gênesis, Isaac se compromete a pagar um dízimo para as obras do Senhor. Na Idade Média, a Igreja de Roma adotou a prática para o sustento de suas iniciativas, recebendo de todos os proprietários uma décima parte de certas colheitas e das crias de certos rebanhos. O dízimo foi sendo lentamente substituído, através dos tempos, pelo óbulo ou pela coleta dominical, hoje em dia voluntária. Agora, com a queda vertical das coletas, resultante do baixo nível de renda das populações interioranas, a igreja pretende revigorar a prática histórica através de uma ampla campanha de conscientização . É, no entender de Murphi , a única maneira de superar as dificuldades, iniciadas com o afastamento da Igreja do estado. Essa separação verificou-se em 1890, logo após o advento da República, quando Manoel Ferraz de Campos Sales ( 1841-1913) era ministro da Justiça do governo Deodoro da Fonseca. Antes a Igreja era sustentada pelo Império e com a desvinculação ela ficou com um rico patrimônio, que não lhe rende coisa alguma, no entanto. Ao contrário, sempre resulta em problemas , pois temos que preserva-lo”, diz Murphi. “Criou-se ainda – acrescenta o bispo – a falsa idéia de que somos ricos. Ora, realmente temos um vasto acervo histórico material e cultural, mas ele é inalienável e sua conservação nos obriga a altos gastos”. Murphi lembra a seguir que os protestantes têm consciência de que devem manter seu pastor e “assim cooperam com frequência e presteza”, o que fortifica a sua pregação religiosa.
EXCEÇÕES
Há, contudo exceções nesse quadro de dificuldades da Igreja Católica. Os franciscanos , jesuítas, salesianos e outros sacerdotes que vivem agregados em ordem religiosas, portanto em comunidade, fazem um voto de pobreza, dividindo os seus bens e geralmente não enfrentam problemas financeiros. Os diocesanos é que realmente têm uma vida difícil. O Padre Osmar Ribeiro, Vigário da Basílica de Salvador, tem uma queixa precisa. “Apesar de minha dedicação de vários anos de trabalho apostólico, ainda não consegui comprar uma casinha para morar. Vivo num pensionato que não corresponde às minhas necessidades.” Como o assunto é muito polêmico, os dirigentes da Igreja o desenvolvem com bastante cuidado . É o próprio Dom Avelar Brandão Vilela que diz ser necessário um estudo de “fundamentação bíblico-teológico-pastoral, além de um trabalho explicativo de caráter popular”. As experiências da arrecadação , que começaram experimentalmente em algumas paróquias baianas, estão sendo analisadas pelos bispos e por Vilela. O chamado Plano do Dízimo já estabeleceu, mesmo, algumas diretrizes, como a implantação gradativa das contribuições oficialmente estabelecidas pela Arquidiocese de Salvador. Enquanto o plano não se estender a todas as paróquias, será mantido o sistema de espórtulas espontâneas. Já se decidiu igualmente que, ao adotar o dízimo, cujo valor ainda será fixado, as paróquias formarão uma comissão para administrar os recursos oriundos da coleta organizada. Paralelamente, haverá uma rigorosa prestação de contas, aberta ao exame dos fiéis.
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