OPINIÃO
Jornal A Tarde 31 de novembro de 2002
Texto Reynivaldo Brito
A ingratidão é um sentimento ou está ligada ao caráter do indivíduo? Tenho em mente uma frase dita por uma pessoa que tem grande experiência de vida que é o psiquiatra Sílio Andrade: "O beneficiado nunca perdoa o favor que lhes faça". Portanto, se você fizer um favor a alguém pode esperar que existe uma grande possibilidade de essa pessoa o evitar ou, na primeira oportunidade, arquitetar alguma ação que desagrade. O favor é impagável.
Diante dessa constatação, o que fazer? Deixar de atender a uma solicitação de um conhecido, colega de trabalho ou mesmo parente? É uma situação embaraçosa e de difícil resposta. Normalmente, optamos por atender, ajudar,até por uma questão, muitas vezes , de sentimento de solidariedade ou humanitário. Mas corremos o risco de receber uma ingratidão de volta.
Acho que ninguém de sã consciência faz um favor ou um bem a alguém esperando troco. Porém, o máximo que podemos esperar é que essa pessoa não nos cause embaraço ou dificuldade.
Tenho observado e sentido na própria pele outra constatação na difícil convivência humana. Diz um dito popular que "a criatura sempre se rebela contra o criador". Isto começou com Adão e Eva, que simbolicamente eternizou o ato da rebeldia representado por uma maçã saboreada por Eva. De lá para cá, bilhões de maçãs foram e são saboreadas todos os minutos pelos que, de alguma maneira, traem seus criadores, tutores e padrinhos.
É a vida, dizem os céticos. Sabemos que a Terra continua a girar e que a vida vai sucumbindo a cada segundo. Sabemos também que as pessoas mudam, e, consequentemente, as relações humanas. Muitas mudam ao sabor das conveniências pessoais e aí bajulam , se humilham, agarradas aos estertores do poder ou de quem está por cima em determinados momentos de sua existência. Mas tudo isso não nos impede de ficarmos indignados com atitudes mesquinhas de terceiros. Este direito inalienável de pensar, de refletir sobre atitudes nos enriquece, desde que guardemos um distanciamento emocional.
Como não busco o reino dos céus, mesmo porque tenho dúvidas se existe uma segunda vida, passa longe de mim o esquecimento dessas atitudes. Ignoro para o resto da vida e desprezo todos os falsos, ingratos e arrogantes. Não os desejo mal algum. Quero que continuem seus caminhos , mas longe de mim.
Nos intervalos de uma entrevista que fiz com um famoso escritor baiano, recentemente falecido , para a revista manchete, ele me revelou três coisas que guardei. Disse-me que àquela altura da vida não queria conhecer mais ninguém e que lhe bastavam os amigos que tinha feito durante sua existência. Disse-me ainda, que preferia estar por perto dos falsos amigos e dos inimigos para vigiá-los melhor. Aí discordo do querido escritor. Ao contrário, prefiro ficar longe dos falsos amigos e dos inimigos gratuitos que, porventura , existam, porque tenho um temperamento de intolerância para com eles.É um defeito, eu sei.Mas, quem não os tem?
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